PONTAL DE CACILHAS: CONVENTO DA ARRÁBIDA QUATRO SÉCULOS DE HISTÓRIA

quinta-feira, setembro 28, 2006

CONVENTO DA ARRÁBIDA QUATRO SÉCULOS DE HISTÓRIA




O Convento da Arrábida, construído no século XVI, abrange ao longo dos seus 25 hectares, o Convento Velho, situado na parte mais elevada da serra, o Convento Novo, localizado a meia encosta, o Jardim e o Santuário do Bom Jesus e ainda, adjacentes ao convento, mas autónomos, os aposentos do duque de Aveiro e as casas onde eram alojados os peregrinos.


No alto da serra, as quatro capelas, o conjunto de guaritas de veneração dos mistérios da Paixão de Cristo e algumas celas escavadas nas rochas formam aquilo a que convencionou chamar-se o Convento Velho. O Convento Novo, o edifício principal a meio da encosta, dispõe de 27 celas, igreja, seis capelas, livraria, refeitório, cozinha, torre de relógio, casa de lavagem e vários fontanários.


A água das fontes continua a ser captada em minas, segundo o sistema hidráulico implantado pelos franciscanos. O Convento foi fundado em 1542 por Frei Martinho de Santa Maria, franciscano castelhano a quem D. João de Lencastre (1501-1571), primeiro duque de Aveiro, cedeu as terras. Anterior à construção, existia onde é hoje o Convento Velho, a Ermida da Memória, local de grandes romarias, junto da qual, durante dois anos, viveram, em celas escavadas nas rochas, os primeiros quatro religiosos arrábidos: Frei Martinho de Santa Maria, Frei Diogo de Lisboa, Frei Francisco Pedraita e São Pedro de Âlcantara.


De arquitectura austera, o convento é praticamente desprovido de ornamentos. No seu interior, destacam-se apenas, de onde em onde, esculturas de santos e Cristos, de terracota e de madeira, colocadas em nichos, os azulejos que ornam as capelas, e ainda os embrechados compostos de pedrinhas misturadas com conchas e cacos de faiança e usados na decoração de fontes, paredes, muros e capelas.


Assinalem-se ainda peças escultóricas de cerâmica e de madeira, cantarias e lajedos, tectos pintados e uma talha dourada. D. Jorge de Lencastre, filho do 1º duque de Aveiro, continuou as obras mandando construir uma cerca para vedar a área do convento. Mais tarde, seu primo D. Álvaro, mandou edificar a hospedaria que lhe servia de alojamento e projectou as guaritas, na crista do monte, que ligam o convento ao sopé da montanha, deixando, no entanto, três por acabar.


Por sua vez, D. Ana Manique de Lara, viúva do duque de Torres Novas e nora de D. Álvaro, mandou construir duas capelas, enquanto o filho de D. Álvaro, D. António de Lencastre, mandou edificar, em 1650, o Santuário do Bom Jesus. Com a extinção das ordens religiosas em 1834, o convento, as celas e as capelas dispersas pela serrania sofreram várias pilhagens e enormes estragos causados pelo abandono.


Em 1863, a Casa de Palmela adquiriu o convento mas as obras só começaram no século seguinte, nas décadas de 40 e 50. Quarenta anos depois, em 1990, o seu então proprietário optou por vender o convento e a área envolvente, num total de 25 hectares, à Fundação Oriente, a única instituição, que, em seu entender, dava garantias de manter os mesmos valores com que, no século XVI, os seus antepassados o entregaram aos arrábidos.


O convento está integrado na Rede de Centros Culturais Europeus implantados em locais históricos.ACTIVIDADE CULTURAL Pouco mais de um ano depois da aquisição, em Novembro de 1991, o convento abria as suas portas para a primeira grande iniciativa para ali programada pela Fundação Oriente.


Tratou-se da segunda assembleia-geral anual do European Foundation Centre, que reuniu no convento mais de 100 representantes de cerca de 60 fundações europeias. "Iniciativas para a Nova Europa - destaque para os países do sul" foi o tema central do encontro que debateu ainda temas como "O papel de Centros Nacionais de Fundações na recolha e difusão de informações".Dando seguimento a um protocolo assinado com a Fundação Oriente, em Julho de 1990, a Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses abria no dia 10 de Julho de 1992 os Estudos Gerais da Arrábida - Conferências do Convento, a primeira Universidade de Verão em Portugal.


Ao longo de 10 anos, esta acolheu, sempre de Julho a Outubro, um programa de cursos, encontros e conferências de grande nível científico e académico. Os cursos, a cuja organização a Fundação Oriente se associou a partir de 1997, proporcionam um lugar de discussão aberto a todos os domínios do conhecimento, numa perspectiva universalista, e cativaram um público susceptível de gerar e fornecer novos conhecimentos.Em 2002, a Fundação Oriente assumiu a realização dos Encontros da Arrábida, dando continuidade ao projecto anterior mas introduzindo algumas alterações ao modelo no sentido de aproximar mais destes encontros o público em geral.


Durante os 10 anos em que decorreram os Estudos Gerais da Arrábida, o convento foi ocupado, de Outubro a Junho, pelos participantes das diversas inicitivas programadas pela Fundação Oriente ou por outras instituições que solicitaram aquele espaço.A preservação do património cultural foi uma das preocupações da Fundação Oriente que, todos os anos, em Novembro, programou para o convento um encontro sobre um tema específico daquela área, aberto a estudiosos nacionais e estrangeiros."O laser aplicado à limpeza e conservação de edifícios e obras de arte" foi o primeiro dos encontros sobre preservação do património, que contou com o apoio do Departamento de Engenharia de Materiais do Instituto Superior Técnico.


Seguiu-se um encontro internacional sobre preservação do património, organizado com a colaboração do Instituto Português de Museus e que reuniu no convento especialistas e conservadores dos mais importantes museus da Europa."A História das Ciências Matemáticas em Portugal: Portugal e o Oriente", um tema que inclui historiografia, epistemologia, astronomia e matemática, foi outro dos encontros programados pela Fundação Oriente na área do património cultural.

Também responsáveis dos mais importantes museus científicos da Europa estiveram reunidos na Arrábida com os seus congéneres portugueses para debaterem os problemas que se levantam aos museus de ciência e técnica. A arqueologia da Arrábida foi também tema de um encontro que juntou no convento os principais responsáveis por estudos arqueológicos na serra e no estuário do Sado, tanto no aspecto da prevenção, gestão e valorização do património arqueológico, como no da inventariação.

De igual modo, o estudo da fauna e da flora da Arrábida levou ao convento um conjunto de reputados especialistas na matéria.Também com regularidade, a Fundação Oriente tem vindo a organizar no convento, geralmente em Fevereiro, uma série de encontros mais virados para a filosofia e pensamento chineses. De entre estes são de destacar os Encontros da Tradição Chinesa que têm contado com a colaboração dos Professores Claude Larre e Elizabeth Rochat de la Vallée, do Instituto Ricci de Paris.

Um seminário sobre poesia chinesa, orientado pelo Prof. Jonathan Chaves e um curso de Zero Balancing, uma técnica que mistura a tradição oriental (chinesa e indiana) e a ciência ocidental, foram outras das actividades realizadas no convento. O curso, o segundo do género a ser realizado em Portugal, foi ministrado pelo especialista britânico, Dr. Timothy Newman, e destinou-se a profissionais de saúde, nomeadamente médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, acupunctores.


Todos os anos no mês de Maio, o convento é palco dos Arrábida Meetings, um fórum de reflexão sobre questões políticas e estratégicas e que reúne alguns dos mais importantes estrategos mundiais. O conselho permanente deste fórum é presidido por Lord Carrington e dele fazem ainda parte Carlos Monjardino, José Cutileiro, Uffe Elleman-Jensen, Yegor Gaidar, Pehr Gyllenhammar, Otto Graf Lambsdorf, Marcílio Moreira, Raymond Barre, Brent Scowcroft, Haruko Fukuda, Andrzej Olechowski e Jaime Gama.


Paralelamente às actividades fixas, a Fundação Oriente tem vindo a realizar no convento outros eventos de entre os quais se destacam a série de quatro seminários "O Franciscanismo em Portugal" - um dos quais se debruçou sobre A Província da Arrábida -, O Encontro Portugal/Índia, o Simpósio de Hidráulica Monástica Medieval e Moderna e um ciclo de Encontros Portugal-China.De salientar que, de uma maneira geral, a Fundação Oriente publica as actas dos encontros realizados no convento, encontrando-se algumas delas já publicadas e outras em vias de publicação.


Para além das actividades acima referidas, o convento está aberto e disponível para acolher nas suas instalações outras instituições que ali pretendam realizar estudos, organizar seminários e reuniões de formação cultural, profissional ou científica ou, simplesmente, encontros de reflexão. Prova disso foi a realização no convento, em Setembro de 1993, da I Cimeira do Partido Socialista Europeu que ali reuniu personalidades como Jacques Delors, Felipe Gonzalez, Michel Rocard, Willy Claes, Pierre Mauroy, Achille Ochetto e António Guterres, entre outros.


Também o I Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, presidido por Mário Soares, reuniu no convento, em Novembro de 1994, uma centena de especialistas das áreas da ciência, letras, arte e religião, vindos de quatro continentes.Mário Soares, na qualidade de presidente da República, escolheu também o convento para, durante a presidência aberta na Área Metropolitana de Lisboa, em 1993, prestar homenagem a Sebastião da Gama, o poeta da Arrábida.


Em 1994, a Fundação assinou com o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais um protocolo tendente a oficializar e reforçar a cooperação já existente com o Parque Natural da Arrábida. De facto, a Fundação e o Parque já anteriormente haviam colaborado no projecto de recuperação dos jardins e no repovoamento vegetal, projecto que, aliás, mereceu o apoio da União Europeia.


A instalação do apiário da Reserva Natural do Estuário do Sado nas instalações do convento e a formação de apicultores foi um dos domínios contemplados por este protocolo, a par da prevenção e combate a incêndios, através da cedência de uma guarita, propriedade da Fundação, para apoio às operações de vigilância e da oferta de uma viatura de primeiro combate a fogos florestais que o parque utiliza nas suas missões regulares de fiscalização da serra.


Com o Museu de Arqueologia e Etnografia de Setúbal têm-se realizado actividades conjuntas como conferências, visitas guiadas e cursos de cerâmica romana.Uma vez por ano, o convento abre as suas portas para a realização de concertos integrados na programação do Festival dos Capuchos. Com a Região de Turismo da Costa Azul, a Fundação e outras entidades da zona, nomeadamente do ramo hoteleiro, assinaram um protocolo que contempla a cedência das instalações respectivas para a realização de reuniões e congressos tendentes à promoção turística da região.


A Fundação tem igualmente dado todo o apoio à Comissão de Festas de Vila Nogueira de Azeitão e de Setúbal, que em Julho, mantendo uma tradição de há longos anos, leva ao convento os peregrinos de Azeitão e Setúbal que ali vão prestar o seu culto a Nossa Senhora da Arrábida. Note-se a propósito que, para além de fazer questão de manter este culto religioso tão arreigado nas gentes da região, a Fundação Oriente solicitou em 1993 ao cardeal patriarca de Lisboa, a nomeação, que foi aceite, do padre franciscano Vítor Melícias, para capelão do convento.


Também nesse ano, as portas passaram a estar abertas aos milhares de visitantes, individuais ou em grupo, que mostram interesse em conhecer o local.Nos últimos anos, o convento tem sido igualmente procurado por realizadores de cinema e documentários que ali encontram um local ímpar para a captação de imagens.


A título de exemplo refira-se a rodagem do filme O Convento, de Manuel de Oliveira, com Catherine Deneuve, John Malkovich e Luís Miguel Cintra, nos principais papéis. Aquela cativa que me tem cativo, uma série de quatro espisódios, de 50 minutos cada uma, realizada por Carlos Barradas para a RTP e que narra a história dos amores e desvarios de Luís de Camões, foi também rodada no convento.


De igual modo, o realizador francês Serge Moati escolheu o convento como local de filmagem do seu telefilme Une Femme dans la Tourmente. A partir do ano 2000, a Fundação abriu o convento a residência de escritores e artistas provenientes de países asiáticos que, anualmente, de Novembro a Abril ali queiram desenvolver o seu trabalho. Na escolha dos residentes - três por ano - é dada prioridade a escritores e artistas das áreas das artes plásticas, do design, da fotografia, da arquitectura e da música.

Fundação Oriente